Os doutores Mark Patterson e Alderi de Souza Matos foram as grandes vozes acadêmicas no terceiro dia (22/10/2025) do 3º Congresso Internacional de Teologia, da Faculdade de Teologia da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (FATIPI). Ambos aceitaram o desafio de refletir sobre a relação entre dois saberes: a Teologia e a História.
Além da História

Dr. Mark Patterson, presidente do Flourish Institute of Theology: School of Ministry, discutiu a relação entre teologia e história, destacando a natureza não-histórica da revelação e a compreensão reformada de Deus como Senhor da criação e da história. Ele se valeu da expressão “não histórico” de Karl Barth para explicar que há acontecimentos que vão além da capacidade do historiador de interpretá-los. Patterson explorou como a teologia deve abordar a revelação divina, argumentando que eventos divinos não seguem a lógica de causalidade histórica natural e estão além da pesquisa histórica convencional. “Jesus viveu e caminhou nessa terra, isso aí é uma história que pode ser estudada por um historiador. Mas agora a encarnação do segundo membro da Trindade, isso historiador nenhum consegue analisar completamente”.
Para ilustrar, ele lembrou que as tensões de teológicos liberais com conservadores na Alemanha, entre os séculos 18 e 19, provocadas por novas concepções, eram carregadas de idealismo e, ironicamente, ambas acabavam separando a fé de qualquer realidade histórica ou teológica. Na ânsia de provar a fé ou torná-la palatável, nenhum dos dois colocava Deus no centro. “É muito importante que nós façamos esforços para olhar objetivamente o coração da nossa fé e o centro teológico, e não só no seu reflexo”, exorta Patterson.
Mark lembrou a incrível história do mergulhador de águas profundas, William Walker, que livrou de um afundamento a Catedral de Winchester, próximo a Londres, no fim do século 19, mergulhando seis dias da semana durante seis anos para instalar 25 mil sacos de cimento no alicerce da igreja. Isso porque, diante de gigantescas rachaduras, descobriu-se que o templo havia sido feito sobre uma terra fofa e muito úmida. Desse exemplo, Mark tirou duas lições para a Teologia: 1) é preciso ter uma base boa para a construção; 2) é muito mais fácil você construir uma boa base logo no começo do que reparar e consertar uma que foi construída de forma errada.
A História hoje
Alderi Souza de Matos iniciou sua palestra definindo Teologia como “a fé em busca de compreensão” (fides quaerens intellectum), conforme Anselmo de Cantuária. Ele enfatizou que, além de seu elemento intensamente pessoal, a Teologia também possui uma dimensão histórica, comunitária e ética. “Na perspectiva reformada clássica, embora a função principal da Teologia seja apontar para um encontro pessoal com Deus por meio de Cristo, ela também possui profundas implicações para todas as dimensões da realidade”, acrescenta.
Desconfiança
Falando mais especificamente sobre a História como atividade científica e acadêmica, o Dr. Alderi discorreu que “a história é, por um lado, a sucessão dos eventos humanos, a chamada história em si, mas que não está mais diretamente acessível, já que estão no passado. Deles só temos fragmentos, relatos, testemunhos e memórias”. Por outro lado, continua ele, a história é também a narrativa e a compreensão desses eventos e processos que aqui nos referimos – o que nos leva à discussão sobre objetividade versus subjetividade no labor historiográfico.

“Hoje, as teorias pós-estruturalistas e outras, que são tão comuns em ambientes acadêmicos, têm gerado grande desconfiança em relação à possibilidade de se resgatar à História qualquer que seja. Tudo é discurso, tudo é subjetivo, tudo é flexível, maleável, sem um sentido inerente, predeterminado. O leitor é quem dá sentido aos textos, aos documentos, às evidências. E com isso, pode se cair no mais pleno relativismo e, por fim, no niilismo. Se tudo tem incontáveis sentidos, nada tem sentido”, critica ele.
“Para os cristãos, a história tem uma profunda relação com o Deus soberano, com uma teologia, embora nem sempre de maneira compreensível. Alguns eventos possuem maior clareza e objetividade, como os desdobramentos da história de Israel, ou então, principalmente aqueles associados à encarnação, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Mas em muitos outros casos, nem sempre se pode discernir o propósito e ação providencial de Deus. Ela é misteriosa, insondável e só o tempo – por vezes, um longo tempo – trará maior compreensão”, conclui.
Sobre os preletores
Rev. Dr. Mark Patterson, presidente do Flourish Institute of Theology: School of Ministry.
O Rev. Dr. Mark Patterson frequentou a Whitworth University, onde estudou Teologia. Após servir dois anos no ministério jovem, ele e sua esposa Linda se mudaram para o Seminário Teológico de Princeton. Após a formatura, ele serviu como pastor associado na Igreja Presbiteriana Wabash, na região de Seattle, por oito anos, quando suas duas filhas nasceram. Em 1995, a família mudou-se para a Grã-Bretanha, onde Mark iniciou seu doutorado em Teologia no King’s College, em Londres. Em 1999, a família mudou-se para Ventura, Califórnia, onde Mark serviu como pastor principal na Igreja Presbiteriana Comunitária por 22 anos.
Rev. Prof. Dr. Alderi de Matos, pastor, professor do Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper e historiador oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB).
Possui graduação em Teologia – Seminário Presbiteriano do Sul (1974), graduação em Filosofia – Pontifícia Universidade Católica do Paraná (1979), graduação em Direito – Faculdade de Direito de Curitiba (1983), mestrado em Novo Testamento – Andover Newton Theological School (1988) e doutorado em História da Igreja – Boston University School of Theology (1996). Professor de teologia histórica no Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper (Instituto Presbiteriano Mackenzie). Redator da revista Fides Reformata. Historiador da IPB. Autor de vários livros no âmbito da história da igreja/da teologia.
Assista às duas palestras, na íntegra, aqui.







