Ferida incurável

A dor do profeta Jeremias por causa do povo de Deus

Jr 8.19-9.1

Textos complementares: Sl 79.1-9; I Tm 2.1-7; Lc 16.1-13

As pessoas reagem de maneiras diferentes mediante as calamidades que caem sobre si mesmas e sobre o seu povo. Nos textos complementares, o salmista clama a Deus pedindo castigo para os opressores, e liberdade e perdão para os pecados do seu povo. O administrador da difícil parábola de Jesus não mede o grau de legalidade de seus atos para livrar-se da queda que sofreu em sua vida. Paulo recomenda ao jovem pastor que estimule a prática da oração de intercessão a favor daqueles que carecem da ajuda divina para resolverem suas dificuldades.

Será analisado aqui um trecho do livro profético onde Jeremias se angustia e desespera por causa da destruição do seu povo. Devido a esta aproximação de assuntos, a análise contará com o auxílio dos textos complementares. O profeta vê abrir em seu coração uma ferida semelhante às que aniquilam as filhas de Sião. O presente estudo terá por tarefa examinar as razões que levaram o profeta a estado tão depressivo.

O profeta sente findar-se o tempo propício para a salvação do seu povo (vv 19-20)

É grande o número de registros de clamor do povo de Deus por livramento e a inquietação pela demora do atendimento divino. Há uma expressão que se tornou marca desta queixa: “até quando, Senhor”. O salmista junta-se ao coro dos que assim clamam. Jeremias usa na construção dos termos de seu lamento a figura das estações do ano.

Há um tempo de recolher aquilo que está à disposição para a manutenção da existência das pessoas. É neste tempo que o profeta esperava encontrar as soluções para salvar seu povo da destruição iminente. Mas esgotou-se tudo o que poderia ser aproveitado da colheita e nada mudou. Ele vê também que está findando o verão, ocasião na qual a vida continua ativa na terra, as pessoas se movimentando, tempo em que se pode pensar na ajuda mútua, tempo das orações de intercessão.

O administrador da parábola sentiu também que este tempo estava passando e apressou-se em buscar o apoio de seus companheiros. O profeta,  porém, olha para todos os lados e não vê qualquer pessoa que deixe seu caminho para transmitir a ele uma palavra de consolo que fosse. Mas o tempo oportuno passou e agora chegou o inverno, quando a neve cobre a terra, todos se recolhem e cessa qualquer oportunidade possível de socorro.

Jeremias sente-se então dominado por profunda solidão. Ele sente como se as sua alma se revestisse de luto, coberto com as roupas com as quais as pessoas lamentam os seus mortos. Muito grande é a tristeza que invade todo o seu ser. Seu corpo treme e se assusta mediante qualquer movimento estranho que dele se aproxima. Sente em si mesmo um quebrantamento que o impede de qualquer ação e em seus ouvidos martela a lamentação. “O tempo propicio passou e nós não fomos salvos.”

O profeta vê esgotarem-se todos os recursos possíveis para a cura de seu povo (vv 21-22)

A ferida é uma das formas que mais expõe a gravidade de uma doença, pela sua aparência desagradável, o odor que incomoda os que se aproximam do enfermo, por deixar o local ferido exposto à fatores externos que podem aumentar o ferimento e favorecer maior contaminação. É esta a comparação que o profeta usa para falar do sofrimento do seu povo. O salmo faz uma descrição terrivelmente realista da destruição de Jerusalém, com os mortos espalhados pelo chão, sem sepultura, os corpos apodrecendo, devorados pelos animais, o sangue formando grandes poças, tudo isto expelindo repugnante odor.

Para as mais graves enfermidades recorria-se a Gileade, região além do Jordão, famosa pela sua flora medicinal, conhecida pela produção de unguentos especiais, usados como produto de beleza e como remédio, especialmente na cura de feridas. Por esta razão a região atraia muitos médicos que se tornavam famosos e eram procurados pelos doentes de toda a região.

O desespero do profeta é o mesmo dos responsáveis por pessoas portadoras de graves doenças ao verem a ineficácia dos mais recomendados remédios e o parecer dos grandes médicos em nada resultarem. Pior ainda, quando os próprios médicos declaram que nada mais pode ser feito para a recuperação da saúde do ente querido. É possível que, em seu desespero, as pessoas gastem toda a sua fortuna, caiam nas mãos de charlatões inescrupulosos, de drogas falsificadas, que podem agravar ainda mais a situação do paciente, para depois declararem, desiludidos: “Acaso não há bálsamo e nem médicos em Gileade. Porque não se realizou a cura da filha do meu povo”?

O desespero do profeta chega ao seu limite por saber que o seu povo rejeita a única possibilidade de cura para a sua ferida (v 9.1)

O profeta sabe que o Deus de Israel é reconhecido como único Deus, Criador de todas as coisas. Muitos séculos à frente, pessoas ainda confessam: “Porquanto há um só Deus”, e declaram que Deus deseja que todas as pessoas sejam salvas e cheguem ao pleno conhecimento da verdade. O seu povo, lamenta o profeta, porém permanece indiferente, não procurando o seu Deus que os livrou tantas e tantas vezes ao longo de sua história. Mas, em vez de se penitenciarem diante da santa presença, provocam ainda mais a ira divina, buscando socorro junto às imagens de escultura e dos ídolos estrangeiros.

Na sequência do texto, Jeremias aumenta e aprofunda a lista dos males que o seu povo continua praticando. Estendem a língua para pronunciarem mentiras.  Avançam de malícia em malícia. São adúlteros traidores, não respeitando entre si sequer os amigos e os irmãos. Pelo contrário, são enganadores, caluniadores, zombadores. Por mais que o profeta os exorte, recusam a conhecer o seu Deus. Mediante tal gravidade, o salmista ainda se anima a suplicar a Deus que se esqueça das iniquidades e perdoe o pecado de seu povo.

A dor do profeta é tão grande que sua vontade seria fugir e se esconder em uma cabana no deserto. Para ele, porém, nada mais resta do que se derreter em lágrimas, que na bela linguagem do texto fica assim: “Prouvera Deus a minha cabeça se tornasse em águas, e os meus olhos em fonte de lágrimas! Então eu choraria de dia e de noite os mortos da filha do meu povo”.

Rev. Lysias Oliveira dos Santos

Ministro jubilado da IPI do Brasil

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