“Vamos nos despojar do supérfluo. É possível descomplicar. Procuremos viver a vida com a beleza da simplicidade, da singeleza. Vivamos do jeito de Deus.”
(Messias Anacleto Rosa)
A simplicidade ainda faz sentido como virtude cristã? Como ser simples vivendo num mundo tão complexo? Como buscar o contentamento quando somos bombardeados diariamente por estímulos de consumo, status, luxo e poder?
O caminho de Jesus
O caminho inevitavelmente passa pelo exemplo de Cristo, que “sendo rico, se fez pobre, por amor de vós” (2Co 8.9).
Tanto o presbítero Eber Evangelista, de 45 anos, da IPI de Cidade Líder, em São Paulo, SP, quanto o diácono Levi Navarro, de 72 anos, da IPI de Muzambinho, MG, destacam essa inspiração.
Para Eber, “tomando-se por base o fato de que a fé cristã é fundamentada em Cristo, quando olhamos para Ele, temos esta resposta. Ele é o nosso modelo completo, em todas as esferas, em qualquer circunstância. E, na condição de servo sofredor, Ele veio também para nos mostrar a importância do autoesvaziamento, de manter o foco na eternidade ao invés do ‘aqui e agora’”.
Levi complementa: “Ser simples é imitar a Cristo, estar satisfeito e alegre com o que se tem e dar valor às coisas que são realmente importantes. Aprendi com meu pai, o diácono João Navarro, que era um homem simples e honesto, que é melhor ter pouco sendo honesto do que muito com maldade”.
Desafios na igreja local
Além de presbítero, Eber também é músico e professor na sua igreja. E é pensando no contexto das igrejas locais que ele vê os maiores desafios para o cultivo da simplicidade: “Eu tenho tristeza em dizer isso, mas acho que uma grande parte das igrejas locais, hoje não contribui para o cultivo da simplicidade. Vejo com muita frequência pessoas abandonando igrejas pequenas, simples, para aderir a comunidades grandes, bem estruturadas, com boa visibilidade, tecnologicamente equipadas etc. O problema não é que haja igrejas de grande porte. Aliás, isto é ótimo, desde que haja um genuíno trabalho de evangelização e acolhimento de qualquer classe social. O problema se estabelece quando os irmãos se deixam seduzir por aspectos externos na busca pela autossatisfação, e deixam de ser úteis em comunidades de poucos recursos, onde toda ajuda é bem-vinda, onde uma simples função faz toda a diferença”.
Levi corrobora essa reflexão ao trazer sua própria experiência: “Na igreja temos vários exemplos de pessoas que vivem a simplicidade. Lembro de uma família que assistimos com alimentos e ajuda. A mãe era viúva e tinha várias crianças pequenas. Hoje, um de seus filhos é presbítero da nossa igreja. Isso me mostra como Deus salva pessoas usando gestos simples para revelar seu amor”.
Como o mundo destrói a simplicidade
Eber e Levi também compartilham preocupações sobre como o mundo contemporâneo dificulta a simplicidade.
Para Eber, “as redes sociais fomentam a autopublicidade. E as selfies mostram o quanto você é bom, eficaz, inteligente, versátil etc. Creio que podemos usar o termo ‘autoidolatria’. O problema não é estar na rede social, mas viver em função dela, neste propósito único e incansável da divulgação própria, sem o objetivo maior, no nosso caso, de exaltar a Deus e testemunhar a Cristo”.
Levi acrescenta: “O mundo faz com que as pessoas sempre reclamem pelo que não têm, ao invés de agradecerem pelo que têm; incentiva a bajular os ricos e poderosos, enquanto ignora os pobres e necessitados. Antes éramos felizes com coisas simples e saudáveis. Hoje, há excesso de tudo, sempre querem mais, e nada satisfaz”.
Um exemplo de simplicidade, eu?
Eber ficou surpreso quando eu disse que muitos o consideram um exemplo de simplicidade:
“Já houve épocas em minha vida em que eu estava muito preocupado com status social e financeiro. Isso me tirava o sono. Mas creio que Deus tem me moldado ao longo dos anos. Hoje, a despeito de ter planos para os próximos anos, tenho aprendido que o presente é, de fato, um presente. Sou grato a Deus por tudo! Não importa se o que eu tenho atende às expectativas do mundo. Tenho absoluta convicção de que Deus tem sido o meu sustentáculo desde sempre, desde a eternidade. Se Ele está comigo, e está, não preciso me preocupar com as demandas que este mundo possa impor”.
Mais que uma virtude: uma ação profética
A simplicidade é mais do que uma virtude individual. Ela também tem o papel de anunciar profeticamente a própria natureza do reino de Deus (de justiça, paz e alegria) e do caráter do Rei (nascido na manjedoura, carpinteiro, mestre que não tinha onde reclinar a cabeça – Lc 9.58).
A simplicidade é a tradução da Palavra de Deus para uma sociedade elitista, consumista, afogada em símbolos não cristãos de identidade, felicidade e poder.
É “jeito”, não regra!
Seguir a Jesus é mais do que uma ordem a ser obedecida; é um “jeito” que deve ser encarnado e internalizado ao ponto de se transformar em algo natural na vida do cristão. É mais graça do que lei; mais amor do que regras; mais sentido do que fórmula pronta.
Para Levi, a solução é simples: “Gaste menos com coisas sem importância, doe o que tem em excesso e socorra quem mais precisa. Simplifique a vida e seja simples. Deus é simples e generoso”.
Eber finaliza: “Cultive uma plena comunhão com Deus. Rejeite as distrações da atualidade e busque intensamente, sem desistir, a comunhão com a Luz”.







