Igrejas que se fecham

As pessoas continuam a buscar algo, mas não encontram

Algo que causa muita surpresa está acontecendo na Europa: igrejas, entre elas tradicionais, estão fechando as portas. Muitas já fecharam. O que está acontecendo? Abandono dos fiéis, falta de pastores e padres, surpreendente transformação de templos em hotéis, livrarias, galerias, pubs, boates, discotecas, hotéis e até residências. O fenômeno atinge Inglaterra, Escócia, Suíça, países escandinavos, Itália e Espanha.

Como explicar? Muitos estão tentando e as respostas ainda não são totalmente satisfatórias. Nas análises, há equívocos, acadêmicos até, ao se referir a isso como se fosse um “pós-cristianismo”. Engano verbal e teológico. Verbal porque como advérbio seria a seguir. Como preposição, depois. Se a pretensão fosse classificar “pós” como o que teria surgido após o cristianismo, o engano seria total. A fuga, em suma, representaria uma decadência do cristianismo, que teria perdido seu espaço por várias razões, como as culturais, e as pessoas, desiludidas, estariam se perguntando: “quem é Jesus?”.

Engano teológico porque a pergunta nada tem de novo. Jesus, diante dos inúmeros comentários que faziam sobre Ele, perguntou aos discípulos: que dizem as multidões que eu sou? (Lc 9-18). A teologia não consegue esgotar o mistério da fé e nem a instituição de uma teoria com o monopólio do terreno sagrado.

Quem sou? Quem és?

A indagação está por trás da pergunta, rigorosamente feita do outro lado do Atlântico. Se fosse, e não é, o “pós” estaria, como pós-verdade, fazendo menção a uma distorção, enfraquecimento deliberado do que é real. Um abandono, fruto de uma espécie de saída cultural diante de um descontentamento do presente ao ver as edificações do passado, várias delas deslumbrantes. A explicação pode ser encontrada no interior dos templos. As pessoas demonstram que continuam a buscar algo, mas não conseguem encontrar. Não interagem em nível cultural. Os tempos são outros, os ácidos da modernidade corroem. A parte íntima, profunda, não encontra o pertencimento, precioso elemento da fé. Resultado visível: faltam fiéis, sacerdotes, voluntários e recursos. Que fazer? Fechar.

O grande número de fechamentos assusta. Algumas igrejas são da época da Idade Média. Na França, por exemplo, como revelou o jornal “Le Monde”, dois franceses entre dez vão à igreja uma vez por mês. Como interpretar isso? Um vazio religioso, um modo de reagir da cultura dominante, comportamento que não significa exatamente um abandono da fé? Santo Agostinho, o de Hipona, ao se converter disse que Deus estava dentro dele, que o procurava por fora. Três dimensões: para fora, no sentido biológico. Para dentro, sentido psicológico. Horizontal, para dentro de nós, o de profundis (das profundezas), Sl 130. Para cima, no sentido espiritual. Pensando assim, vemos que não se trata de desafio contracultural, mas uma reconciliação com a civilidade e ter outros olhos para o que se convencionou chamar de rejeição do “mundo”, como Jesus já mencionou como uma forma de não pertencimento. É possível que estejam pensando numa redenção do passado, quando os hábitos e costumes eram bem diferentes, numa tentativa de reescrever a História. Jesus nos ensinou muita coisa. Mas temos preferido descartar algumas delas, como se não tivessem importância nos nossos tempos em que vivemos. Pecados? Vamos claramente definir. Como? Observando na Palavra: Paulo diz (Rm 1.28) que haveria desprezo pelo conhecimento de Deus. Sendo esse conhecimento o encontro com a Verdade, vemos em João 14.6 Jesus se identificando como a própria Verdade, que não pode ser mudada de Deus para mentira, adorando e servindo a criatura em lugar do Criador (Rm 1.25). Na leitura de 2 Tm 4.3, somos avisados de que teremos tempo em que não suportarão a sã doutrina, cercar-ser-são de mestres, seguindo as suas próprias cobiças.

Por que os templos estão sendo fechados? Em nosso país, alguém ser classificado como “evangélico conservador” se relaciona mais com cultura do que com a teologia. Busca, ausência, preenchimento – ou seja, a revelação de João de Patmos, o apocalipse, palavra que quer dizer “descoberta”. O prefixo “apó”, no original grego, está escrito como afastar-se e “kalypsis” a cobertura – telha ou véu. Quer dizer: retirar o véu que nos força a ver as coisas de uma forma que procurávamos evitar.

Tiremos o véu que encobre os templos fechados. Alguns foram demolidos. Não é tarefa fácil encontrar o misterioso caminho de Deus. Até mesmo para os apóstolos foi difícil. Encontrar (busca) não é achar (mero acaso). Aqui continuamos. Somos cristãos reformados: em vez de fechar templos, preferimos plantá-los.

 

 

Foto de Percival de Souza

Percival de Souza

Jornalista e membro da 1ª IPI de São Paulo, SP 

Compartilhe este conteúdo. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Conteúdo Gratuito

Notícias Relacionadas

Categorias

Seções

Artigos por Edições

Artigos mais populares

Não Existem mais Posts para Exibir
plugins premium WordPress
Política de Privacidade

Este site usa cookies para que possamos fornecer a melhor experiência possível para o usuário. As informações dos cookies são armazenadas no seu navegador e executam funções como reconhecê-lo quando você retorna ao nosso site e ajuda a nossa equipe a entender quais seções do site você considera mais interessantes e úteis.