A escatologia, ou estudo das últimas coisas, tem sido um tema central na igreja cristã desde os primeiros séculos.
Essa doutrina, que mira os eventos futuros, influencia nosso estilo de vida e engajamento missionário neste mundo.
No entanto, sabemos que não há unanimidade entre os cristãos quanto ao fim dos tempos. A escatologia sempre foi um campo de intenso debate e, por vezes, de desafios teológicos.
Com cautela, refletiremos sobre o estado atual da escatologia na IPI do Brasil ao longo de doze breves textos.
Inicialmente, abordaremos a influência da linha dispensacionalista.
Em seguida, discutiremos a importância de olhar para o passado e resgatar a herança teológica presbiteriana, conhecida como Teologia da Aliança, para realinhar a perspectiva escatológica e desenvolver uma compreensão mais coesa e bíblica do presente e do futuro.
O contexto histórico e teológico da escatologia no presbiterianismo
O presbiterianismo possui uma herança teológica ligada aos princípios da Reforma Protestante, especialmente à convicção das Escrituras como única fonte normativa para a vida cristã.
Essa herança também está indissociável do compromisso com a Teologia da Aliança, uma perspectiva que molda a interpretação bíblica e a vida da igreja, exposta em obras como As Institutas de Calvino e A Confissão de Fé de Westminster (1646).
Mas o que é exatamente a Teologia da Aliança?
Trata-se da espinha dorsal da nossa teologia, pois todos os temas teológicos se interconectam com o tema Aliança.
Essa abordagem enfatiza a unidade do plano de salvação de Deus desde o Antigo até o Novo Testamento, por meio da aliança de graça anunciada desde Gênesis 3.15.
Essa aliança abrange um único Salvador, Jesus Cristo, para todos os povos, judeus e gentios, unidos pela mesma promessa de salvação pela fé em Cristo e compartilhando o mesmo destino eterno.
Em outras palavras, a Teologia da Aliança afirma que há continuidade entre o Antigo e o Novo Testamento quanto à essência do pacto de Deus com seu povo, mas há descontinuidade quanto à forma como esse pacto foi administrado ao longo da história.
Embora o presbiterianismo tenha suas raízes na Teologia da Aliança, no século XIX, alguns pastores presbiterianos dos EUA começaram a adotar um sistema teológico recém-formulado na Inglaterra, o dispensacionalismo.
Tal sistema se distanciava da tradição reformada, especialmente por adotar uma leitura mais literalista da Bíblia dividindo a história da salvação em diferentes “dispensações”, nos quais Deus interage de forma distinta com a humanidade.
Uma das suas principais características é a separação entre Israel e a Igreja, com a crença de que as promessas feitas a Israel no Antigo Testamento ainda são válidas e se cumprirão de maneira literal no futuro, enquanto a igreja possui um papel distinto no presente.
Além disso, o dispensacionalismo defende o retorno iminente de Cristo, antes do estabelecimento de um Reino Milenar literal (pré-milenismo).
Apesar de sua adesão ao dispensacionalismo, os presbiterianos norte-americanos não romperam completamente com a Teologia da Aliança, especialmente em áreas como sacramentos e eclesiologia.
No entanto, ficaram atraídos pela maneira como o dispensacionalismo oferecia uma interpretação específica e diferenciada dos eventos escatológicos.
Embora seja difícil apontar um único motivo para essa mudança, é possível observar que eventos históricos, como a Guerra Civil Americana (1861-1865) e as guerras mundiais do século XX, contribuíram consideravelmente para isso.
No Brasil, essa mudança também foi sentida. O Rev. Eduardo Carlos Pereira, fundador da IPI do Brasil, também se “converteu” ao novo pré-milenismo e passou a pregar sobre esse tema nos últimos anos de seu ministério.
Curiosamente, ele chegou a prever o arrebatamento da Igreja para 1923, conforme relatado pelo também “convertido” ao pré-milenismo, Rev. Alfredo Borges Teixeira, em seu livro Maranata.
Nos anos seguintes, com o crescimento do movimento pentecostal e do evangelismo bíblico nos EUA, o dispensacionalismo ganhou popularidade no Brasil, especialmente após a publicação de obras de autores como Hal Lindsey e da Bíblia de Scofield, que divulgaram essa visão escatológica, inclusive dentro da IPI do Brasil.
Retomando o caminho para o futuro
Quais são as implicações de adotar uma linha teológica ou outra? Como uma interpretação escatológica influencia o estilo de vida cristão?
Ao longo dos próximos textos, exploraremos mais profundamente as diferenças entre a Teologia da Aliança e o dispensacionalismo, e como a primeira molda não apenas nossa visão do futuro, mas também nossa missão no presente.
Rev. Rodrigo Falsetti, pastor auxiliar na 1ª IPI de Bauru, SP, e professor no Instituto John Knox







